Dos mitos aos memes… do amor a si mesmo para o amor ao mundo.

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Um hábito interessante que adquirimos nos dias de hoje é o compartilhamento de memes com amigos. Essa virou um pouco a nossa maneira de falar dos nossos sentimentos, nossos costumes e criar laços de identificação com aqueles que nos interessam. 

Compartilhar estórias sempre foi prática do ser humano. É algo que é feito desde a Antiguidade e continua até hoje.  Os mitos são as estórias que surgiram naquela época para que as pessoas falassem sobre si mesmas e sobre o mundo ao seu redor. Esses mitos hoje são utilizados na psicologia junguiana pois retratam situações, comportamentos e potencialidades que nos atravessam tanto como humanidade quanto individualmente. 

Dentre a infinidade de estórias míticas, existem duas que são muito significativas na psicologia: o mito de Narciso e o mito de Eros e Psiquê. Vou contá-las aqui de maneira muito simplificada, mas para assim desenvolver um pouco a ideia que quero passar.

Sobre Narciso… ele era um criança de beleza única. Como sua beleza poderia ser uma afronta aos deuses, sua mãe se consultou com o oráculo para saber mais sobre os perigos que isso podia trazer. A mãe foi então advertida de que ele viveria por muitos anos desde que não visse a si mesmo e por conta do aviso, providenciou para que não houvessem espelhos pela casa. Narciso então passou boa parte da sua vida sem se ver/reconhecer e tampouco não se interessava pelos outros, apesar de ser admirado por uma imensidão de apaixonados.

Narciso também não se interessou por Eco, uma bela ninfa que por ele havia se apaixonado perdidamente. Eco havia sido amaldiçoada por Hera e era incapaz de ter voz própria, não fazia nada senão repetir as últimas palavras do outro sem qualquer protagonismo. A maldição de Eco e a sua paixão cega a fez se isolar cada vez mais do mundo, até que deixou de se alimentar e acabou transformando-se num rochedo, repetindo apenas os sons do que os outros diziam.

Narciso por sua vez acabou sendo vítima do apaixonamento pelo próprio reflexo em um lago, imagem essa que achou que fosse de outra pessoa (uma vez que nunca havia se visto). Com a intenção de ir atrás desse amor acabou pulando no lago, o que culminou em sua morte.   

Há uma força simbólica nas estórias de Narciso e Eco que são entendidas na psicologia como duas polaridades de um mesmo eixo. Ambos polos (a capacidade de vermos a nós mesmos e vermos ao outro) precisam ter espaço em nossa vida se não quisermos acabar em desgraça. Não se pode permanecer somente em si mesmo, nem somente no outro – temos que nutrir um amor-próprio e, ao mesmo tempo, ter ouvidos e cuidado com o outro, mas sem ecoá-lo em demasia. 

É aí que a estória de Psiquê pode nos falar sobre um movimento muito importante para o encontro do outro. Psiquê, que simbolicamente pode ser entendida como nosso psiquismo, nossa alma, era uma mortal belíssima que em meio a um sacrifício ao qual havia sido condenada, acaba sendo salva por Eros (o deus do Amor) com quem vive uma linda paixão. O romance acaba sendo interrompido por um descuido de Psiquê e ela, para resgatar seu amor, precisa seguir numa corajosa jornada cheia de desafios perigosos e mortais. Ao mesmo tempo que se desespera por vezes, Psiquê recebe a ajuda das forças divinas, desenvolvendo suas forças pessoais e intuitivas, conseguindo percorrer seu caminho com resiliência para finalmente unir-se ao Amor. 

O que isso pode falar sobre nós? É preciso desenvolver uma boa dose de autoestima, mas também treinar a capacidade de ver, ouvir e respeitar o outro em suas diferenças. E para seguir no caminho de alguma saúde psíquica, de maneira vívida e conectada (para que nossa Psiquê encontre seu Eros) é preciso ter coragem para cruzar os desafios que muitas vezes nos parecem impossíveis: estejam estes desafio nos relacionamento, no trabalho, nos estudos, no enfrentamento de lutos, perdas ou outras situações dessas que a vida está cheia.

A psicoterapia é também aquela que ajuda a psique em seus desafios, no desenvolvimento para um amor-próprio autêntico e um olhar de alteridade para o mundo. É também preciso de muita coragem. 

E como você está indo em sua jornada?  

Imagens: Whaterhouse.